domingo, 23 de agosto de 2009

Padeço enquanto a Justiça não chega




No ano de 2003 o CREMESP colocou diversos obstáculos contra a criação de uma ONG na área da saúde (Saúde Direta), obstáculos estes que se resumiam no seguinte - qualquer empresa que qualquer médico queira criar, mesmo que não envolva atividade médica, deve pagar anuidade para o Conselho. Isto em outras palavras quer dizer que se você, colega, participar como um dos sócios de uma empresa de consultoria, esta constituída por engenheiro, advogado, dentista, veterinário e voce, como médico, todos são obrigados a pagar anuidades como pessoas físicas e anuidades como pessoa jurídica (duas para cada conselho), mesmo que não exerçam a atividade profissional específica, e para funcionarem numa mesma sala e muitas vezes numa mesma mesa.

Isto é regra em todos os conselhos de profissões, que passam grande parte do seu tempo editando resoluções e brigando entre si para fatiarem o mercado de trabalho. O de Engenharia Química (CREA) briga com o de Química, o de Veterinária briga com o de Zootecnia e o de Agronomia, o de Enfermagem briga com o dos Médicos, e assim por diante. Tudo não passa de luta por reserva de mercado, para proteger interesses corporativos. Procuram avida e incessantemente enquadrar empresas como seus contribuintes compulsórios, cobrando anuidades sobre o patrimônio das empresas.

Continuando, para registrar minha ONG, o Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas notificou-me que precisaria ter um aval do CREMESP. Precisávamos de uma permissão do CREMESP. O aval a ser fornecido pelo CREMESP deixava claro que só existe uma espécie de empresa para eles - aquela que paga a sua anuidade. Deveriamos registrar a ONG primeiro no CREMESP, pagar as taxas e anuidade, para depois conseguirmos registra-la em Cartório. Resumindo, a ONG, que ainda não existia legalmente, só no papel, deveria ser registrada no CREMESP para depois ter seu registro em cartório e posteriormente conseguir seu CNPJ. É Kafkaniano. Registra-se primeiro o que não existe, paga-se taxas e anuidades de um ente jurídico inexistente, para poder existir meses depois. Se a moda pega, devemos primeiro registrar nossos futuros filhos nos cartórios, antes deles nascerem...

Provamos, com pareceres de advogados e jurisprudëncia, que não éramos uma empresa de saúde e sim uma entidade sem fins lucrativos que congregaria médicos e demais entidades de saúde, à semelhança de um clube. Pensávamos que sendo uma entidade sem fins lucrativos, sem vínculos com a atividade médica, estávamos isentos de registro no Conselho. Ledo engano. Alíás o CREMESP estava exigindo anuidades dos clubes de São Paulo porque todos possuem um médico para exame de piscina, portanto classificou os clubes esportivos de São Paulo como empresas de saúde e logo devedoras de suas anuidades. Se um colega fundar um clube de futebol de botão e tentar registrar este clubinho recreativo, vai ter que conseguir um parecer e pagar anuidade para o CREMESP, senão não registra em cartório. Se tem médico logo exerce medicina e deve pagar anuidade para o CREMESP. Médico é propriedade do CREMESP.

O parecer contra do CREMESP nos era impositivo, ou seja, ou paga ou não tem aval para registrar no cartório. Pesquisamos e encontramos na legislação uma norma legal que permitia o registro das empresas nos cartórios sem a necessidade do aval de conselhos de profissões (nem o cartório conhecia esta instrução normativa emitida pela Corregedoria da Justiça de SP). Com esta norma nas mãos registramos a ONG. Enquanto isso, após um ano de espera, o CREMESP, através da sua presidente Dra Regina Parisi, para encerrar o assunto, deu um parecer definitivo proibindo-nos de registrar a ONG porque eles não sabiam como enquadrá-la. Para o CREMESP só existe uma espécie de empresa - a que paga a sua anuidade. A ONG estava registrada com CNPJ sem aval do CREMESP e não pagamos nenhuma anuidade e taxa exigida. Esta querela com o CREMESP nos custou muito tempo, dinheiro e aborrecimentos.

Conversando a respeito disto com outros profissionais, conheci o advogado Dr Marcel Nadal Michelman que defendeu sua Tese de Mestrado sobre os fundamentos legais das anuidades dos conselhos de profissões regulamentadas. A tese demonstra claramente que as anuidades são cobradas sem amparo legal, sem lei aprovada no Legislativo, e seus valores eram arbitrados por resoluções internas dos conselhos. Isto significa que as anuidades, classificadas como tributos federais, são estipuladas por resoluções e não por lei aprovada no Congresso, como exige a atual Constituição Federal. Surpreendente. Os médicos pagam anuidades do CREMESP (CFM) há décadas e não sabem que o valor desta cobrança é ilegal. Portanto têm o direito de não pagar as anuidades até que exista Lei aprovada pelo Legislativo estabelecendo seu valor. Até hoje não existe esta Lei. O Legislativo não definiu o valor a ser cobrado.

O Dr Marcel, além de advogado, é músico e aplicou sua tese de mestrado para defender os músicos das arbitrariedades de cobrança de anuidade pela Ordem dos Músicos do Brasil (OMB). Impretou mandado de segurança contra a OMB e já ganhou em primeira e segunda instância. A OMB tem a petulância de aparecer em um local onde se apresenta um músico e exigir dele a carteirinha de filiado. Se este não tiver a tal da carteirinha, eles tentam fechar o estabelecimento alegando infração da lei, etc... Nunca conseguiram fechar nada, mas coagem os músicos desta maneira. Não vou me alongar mais falando a respeito da OMB, basta pesquisar na web e descobrir as diversas mazelas desta entidade e os processos que seu presidente responde na justiça comum por desvio de recursos e apropriação indébita.

Através do Dr Marcel, aplicando o mesmo princípio legal, impetrei em março de 2004 dois mandados de segurança contra o CREMESP no Tribunal Regional Federal da Terceira Região. Os processos, para quem se interessar, são os seguintes - 20046100009093-7 e 20046100009092-5. Um para pessoa física (Paulo Celso Budri Freire) e outro para pessoa jurídica (Clínica Mairink - minha clínica).

Os dois mandados de segurança ficaram aguardando a sentença na primeira instância durante todo o ano de 2004. Neste ínterim, os conselhos de profissões, cientes que estes mandados eram uma estaca no coração financeiro deles, pois sabem que não existe lei amparando a cobrança das anuidades e existe recentíssima jurisprudência contra a cobrança e a Lei 11.000. Juntaram o CONSELHÃO (amontoado de conselhos federais) e foram para Brasília levar uma medida provisória de urgencia para ser assinada pelo Presidente, e esta imediatamente foi convertida em Lei 11.000 com apoio de tres senadores (Senador Sérgio Guerra - PSDB, Senador Tião Viana - PT e Senador Artur Virgílio - PSDB). Isto ocorreu em dezembro de 2004.

Esta Lei passou a vigorar no dia da sua publicação (DOU Nº 241 - 16 de dezembro de 2004). Imediatamente o Juiz da Primeira Instância do TRF (SP), que estava literalmente sentado durante meses nos meus mandados de segurança, no dia 15 de dezembro (antes da publicação do DOU) despertou e sentenciou, denegando meus mandados de segurança alegando (está escrito claramente nos autos) que agora existe Lei e portanto denego os mandados de segurança. Foi uma decisão surprendente para um Juiz Federal, pois retroagiu a ação da Lei 11.000 para me prejudicar e aplicando-a retroativamente, uma lei que foi publicada 1 dia após sua sentença. A frase - Agora já existe Lei - nos faz concluir que então, até a presente sentença, não existia lei alguma e portanto meus mandados são procedentes.

O mais interessante é que, pesquisando este tal juiz inovador da jurisprudencia brasileira, ele está sob investigação da Corregedoria do Tribunal, por envolvimento na máfia do Juiz Lalau, aquele que vendia sentenças, e que está preso.

O CREMESP se rejubilou e imediatamente acionou a justiça para me exigir as anuidades não pagas (não devidas por Lei) e enviou-me boletos de cobrança com multas e atualização do saldo.

Recorri da sentença exdrúxula. O processo foi encaminhado para a segunda instãncia do mesmo Tribunal Federal. Enquanto isto um outro amigo, Prof Fernando Lima, professor de Direito Constitucional preparou-me uma peça de representação para ser protocolada na Procuradoria Geral da República contra a Lei 11.000. Apresentei e protocolei esta representação na PGR em 2005, alguns dias depois da Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL) fazer o mesmo através de uma AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 3.408 que está correndo no Supremo Tribunal Federal.

Enquanto aguardamos a decisão do STF, e dos meus dois mandados de segurança no TRF (SP) o CREMESP colocou-me na Dívida Ativa da União, apesar dos processos serem exatamente sobre a cobrança desta alegada dívida. Culpado ou inocente tenho que pagar mesmo assim. Se pagar agora corro o risco de não reaver o que me cobraram indevidamente ou receber em Precatórios Podres. Se ganhar a ação pretendo reaver o que paguei indevidamente, e em dinheiro vivo, por mais de 25 anos de exercício da medicina.

Enfim, o CREMESP acionou a Justiça Federal (o mesmo TRF da Terceira Região, que há seis anos está para decidir meus mandados) e este rapidamente mandou um Oficial de Justiça penhorar meus bens (21 de agosto de 2009), que irão a leilão público.

Vejam só - o CREMESP, que arrecada mais de 65 milhões de reais anualmente dos médicos, penhorou meus bens devido a uma suposta divida (contestada na Justiça) de R$3.000,00. Senhores conselheiros do CREMESP, este valor não paga um jeton daqueles percebidos pelos seus 42 pares. Pelo visto este valor é tão necessário para a receita do CREMESP que não podem esperar pela decisão da Justiça. Precisam arrecadar na marra do médico. Tenho a certeza que esta penhora é de caracter educacional-punitiva, para que nenhum outro médico se atreva a levantar a voz contra a multimilionária Corporação de Ofício Médico.

A Assessoria Jurídica do CREMESP, se é que ainda não atinou, saberá que entrei com embargo da penhora. O CREMESP tem uma imensa vantagem sobre mim, que é o seu poder financeiro. São uma potencia econômica, financeira e arrecadatória, a dar inveja às maiores empresas deste país. Arrecadam milhões sem fazer força, pois para eles a anuidade tem cara de tributo para os médicos e cara de contribuição social para o Tribunal de Contas da União e Receita Federal. Duas faces da mesma moeda, se não pagamos vira tributo federal sonegado, e se a justiça pede explicações vira contribuição social. Constitui-se numa entidade privada de direito público, não vinculada a nenhum órgão ou ministério público. Seus presidentes, conselheiros e demais dirigentes não são funcionários públicos concursados mas utilizam e recebem dinheiro de tributos, portanto, dinheiro público e da União. Isto vai de encontro ao Código Tributário Nacional e Constituição Federal. É uma aberração constitucional que exigiu uma classificação como autarquias muito especiais, tão especiais, mas tão especiais, que ninguém sabe que bicho são. Só eles estão fora da classificação normal e das leis que regem as autarquias federais, onde se enquadram o Banco do Brasil, Banco Central, todas as Universidades Federais, e todas as outras autarquias, como direi, normais.


A briga ainda não acabou. A única decepção que tenho nisto tudo é a falta de solidariedade dos colegas médicos. Apenas dois colegas se manifestaram a meu favor e foram esquartejados em praça pública (Dr. Magnus Amaral Campos e Dr. João Benedito Legatti, este último falecido recentemente).

Todos os médicos, hospitais, laboratórios de análises clínicas, casas de saúde, clínicas, consultórios médicos, enfim, todos que pagam anuidade para os Conselhos Regionais de Medicina, podem ser favorecidos pelas minhas ações na justiça. Todos podem reaver as anuidades pagas indevidamente ou a mais para estes conselhos.

Não é uma briga por pirraça, vingança ou implicância com o CREMESP. É uma briga por aquilo que é correto, briga por Direitos Constitucionais, briga para que a Lei seja respeitada e cumprida por todos. Briga contra injustiças e corrupção das leis. No Brasil dos privilégios e atos secretos de hoje cada um faz o que quer e grassa a impunidade geral. Pode mais quem tem mais dinheiro. Cabe ao cidadão apenas abaixar a cabeça, ficar calado e pagar tributos, sejam eles justos ou injustos.

Isto não se aplica a mim.

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